Nota do Presidente
A análise de 2020 é um desafio de enorme complexidade pelo turbilhão de acontecimentos que alteraram o que parecia ser uma navegação desafiante, segura e sem sobressaltos, de uma cidade que, no final do ano de 2019, vivia um momento ímpar de crescimento, prosperidade e dinamismo.
O município libertara-se de um – já longo - ‘espartilho’ financeiro ao atingir as marcas históricas de dívida bancária zero e de aprovar, para 2020, o maior orçamento de sempre: 315 milhões de euros, permitindo-nos encarar o futuro próximo com muita confiança.
A erupção da pandemia, no final de 2019, atingiu Portugal em Março de 2020, com o surgimento dos primeiros casos de infecção por SARS-CoV-2 a serem registados precisamente na cidade do Porto, instalando-se uma crise sanitária, económica e social de dimensão imprevisível.
Assim confrontados, quis este Executivo que essa incerteza não fizesse perigar as propostas que havíamos feito à cidade para 2020, assentes nas traves mestras da política sufragada pelos portuenses em 2017.
Apesar de ser muita a incerteza, tal não impediu que assumíssemos, sem hesitações e com o pioneirismo que também caracteriza o Porto, a dianteira no apoio ao combate dos efeitos da pandemia, antecipando o impacto sanitário e as suas consequências económicas e sociais mais imediatas.
Promovemos, por isso, iniciativas de apoio às estruturas locais de saúde para mitigar a crise sanitária, quer através da compra de equipamentos, quer através da criação de estruturas complementares de apoio, e assumimos uma política orçamental contracíclica, abdicando de receita própria sem descurar a necessidade de concretizar o investimento previsto e de aumentar a despesa com medidas de suporte social, económico e cultural, mandatando-se as empresas municipais para a aplicação de medidas de igual natureza.
A cidade beneficiou da sustentabilidade das políticas municipais, criteriosamente introduzidas e desenvolvidas ao longo deste últimos anos e expressa na solidez das contas municipais que agora se apresentam.
Em termos financeiros e olhando para os grandes números, o impacto na receita municipal foi de -7,9 M€ (-2,4%). As receitas fiscais, que continuam a ser as receitas com peso mais significativo nas receitas correntes, caíram 17,0% (-30,7M€). No seu conjunto, as receitas correntes reduziram-se em 13,6% (-31,7 M€). O decréscimo da receita foi atenuado pela incorporação do saldo da gerência de 2019 que, de uma forma não desejada, acabou por sublinhar a bondade da prudência, do rigor e da sustentabilidade dos orçamentos municipais.
Apesar das quebras inesperadas e impactantes na receita, não foram comprometidos aqueles que são os três grandes pilares da estratégia gizada por este Executivo: “Coesão e Accão Social”, “Economia e Desenvolvimento Social” e “Cultura”, que representaram 22,6% (52,3M€) da execução do orçamento e aumentaram, relativamente a 2019, 13,9% (+6,4M€).
Por outro lado, o investimento ascendeu a 70,4 M€, correspondendo a 30,4% do total da execução orçamental, ambos os valores sem paralelo nos últimos 16 anos.
De entre um conjunto de medidas de apoio a cidadãos em situação de extrema fragilidade e pobreza, reforçámos a oferta alimentar a pessoas em situação de sem-abrigo servindo cerca de 140 mil refeições na rede municipal de restaurantes solidários, prosseguimos a reabilitação do nosso edificado municipal com intervenção em mais de dez bairros de renda apoiada, num investimento a rondar os 20 milhões de euros, reabilitámos perto de 300 habitações devolutas, atribuímos casa a 201 famílias carenciadas, apoiámos dezenas de associações da cidade com trabalho na área social, cultural e desportiva, e aumentámos em 1,32 milhões de euros o programa “Porto Solidário – Fundo de Emergência Social”.
Iniciativas sempre insuficientes, mas essenciais para apoiar a segurança e a qualidade de vida dos munícipes mais carenciados, garantindo a sua inclusão, evitando o desenraizamento num momento tão crítico que a quebra da atividade económica tendeu a acentuar.
No campo económico e de desenvolvimento social, prosseguimos o apoio e a proteção dos nossos comerciantes históricos através da iniciativa ‘Porto de Tradição’, disponibilizámos a linha “Revitaliza Porto” que prestou suporte a mais de uma centena de empresas e demos continuidade a uma das maiores empreitadas com que este Executivo se comprometeu: a do Restauro e Modernização do Mercado do Bolhão.
Neste domínio, e talvez da maior importância, é o facto de mesmo em contexto de imprevisibilidade para muitas empresas nacionais e internacionais, termos tido a mestria de não descurar o trabalho de captação e apoio ao investimento na cidade. O resultado? No total, falamos de 100 projetos em diferentes fases de avaliação ou implementação que, no futuro, poderão representar mais de mil milhões de euros de investimento e a criação de mais de 3.600 postos de trabalho directos no Porto, iniciativas essenciais para robustecer o tecido empresarial da cidade, imprescindível à retoma da economia que todos almejamos.
A crise pandémica veio expor ainda mais as fraquezas no setor cultural e, simultaneamente, demonstrar o quão necessária é esta actividade para as populações, para o seu desenvolvimento e enriquecimento pessoal e social.
Com um investimento superior a 13 milhões de euros, a Cultura teve ainda assim, apesar de todas as contrariedades e incertezas, que motivaram um desafiante exercício de reprogramação e adaptação a novos formatos, momentos altos em 2020 que importa salientar. Desde logo a consolidação e apresentação da estrutura artística e multifacetada do Museu da Cidade, mas também a realização de uma edição histórica da “Feira do Livro” que celebrou o - ansiado- regresso do Porto à actividade cultural, com uma programação alargada a diferentes polos e conteúdos programáticos e envolvendo mais de 100 mil visitantes.
Incontornáveis, também, são projetos como o Matadouro, que após meses de retrocessos e imbróglios administrativos pôde avançar, a reabilitação do Mercado do Bolhão, a construção do Terminal Intermodal de Campanhã, a requalificação do cinema Batalha. Projetos âncora deste Executivo, há décadas desejados pelos portuenses e que irão reconfigurar e rejuvenescer as respectivas áreas de implantação, mudando o panorama cultural, social e económico da cidade de forma inequívoca e irreversível.
Resiliência, rigor e foco foram fatores críticos para enfrentar o atípico ano de 2020.
De forma empreendedora, aguerrida, permeável e proactiva, fomos capazes de adaptar-nos a um contexto de enormes dificuldades. Soubemos fazer das fraquezas forças, redesenhámos e reinventámos processos, através de uma gestão de recursos rigorosa, cautelosa e planeada, com uma colaboração escrupulosa de todos os trabalhadores do universo municipal, incansáveis no seu espírito de missão.
Mantivemo-nos centrados no que é realmente importante: o bem-estar e a qualidade de vida dos munícipes.
Há muitos ensinamentos que, decerto, poderemos retirar dos últimos meses. Não é algo que farei neste momento dada a impossibilidade de distanciamento que só o tempo permitirá. Certo é que há algo que sempre defendemos e que veio a provar-se avisado nos conturbados tempos que vivemos: acertámos quando assumimos claramente a aposta nas “boas contas”.
São precisamente as “boas contas”, as “contas à moda do Porto”, que nos permitem deixar à Cidade, sem onerar ou comprometer as gerações vindouras, a garantia de uma cidade mais sustentável, mais segura, mais solidária e mais inclusiva.
Enfrentar o atípico ano de 2020, que a todos perturbou, carregado de imprevisibilidade, incerteza e desafios impensáveis, não nos afastou dos objectivos que propusemos à cidade com um orçamento assente nos pilares da política sufragada em 2017 e cuja prestação de contas agora apresentamos.
Rui Moreira